A chegada de um general para comandar a Petrobras a partir de abril reforçou a forte presença de militares na chefia de estatais. Um levantamento feito pelo Portal Metrópoles mostra que os militares comandam hoje parte expressiva das empresas públicas do país: ao todo, são 16 presidentes em 46 empresas, com salários entre R$ 20 mil e R$ 106 mil.
O maior valor pago a um presidente de estatal será do general Luna e Silva, que vai comandar a petroleira a partir de abril. Considerando bônus e outros benefícios, o salário dele pode chegar a R$ 226 mil por mês.
A lista de empresas presididas por membros das Forças Armadas ainda pode aumentar nos próximos dias. O governo não descarta nomear para a Eletrobras o oficial da reserva da Marinha Ruy Schneider, atual presidente do conselho da estatal. A empresa, contudo, contratou um headhunter para definir o substituto de Wilson Ferreira Júnior, que pediu demissão e fica no cargo até 15 de março. O salário do escolhido: cerca de R$ 78.400.
Além dos altos salários, os militares que comandam as estatais também recebem benefícios. Para dirigir a Companhia Docas do Rio de Janeiro (CDRJ), por exemplo, o vice-almirante Francisco Magalhães Laranjeiras ganha R$ 37.856 por mês. Ele ainda tem direito a tickets refeição no valor de R$ 1.057,20 por mês (com um 13º como adicional); adicional de 50% do valor do salário nas férias (para o trabalhador comum o valor é 1/3), adicional por tempo no serviço e folga por trabalhar no Dia do Portuário, entre outros. A Docas controla os portos de Rio de Janeiro, Niterói, Itaguaí e Angra dos Reis.
Os oficiais também comandam Correios, Infraero, Amazul, Indústrias Nucleares do Brasil, Companhia das Docas do Estado da Bahia, Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A., Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, Empresa Gerencial de Projetos Navais, Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., Empresa de Planejamento e Logística S.A., Financiadora de Estudos e Projetos e Indústria de Material Bélico do Brasil.
Privatização
Os dados dos salários pagos pelas empresas públicas constam no relatório do Ministério da Economia, que expôs os vencimentos e outros privilégios concedidos pelas estatais. O objetivo do governo é defender que as empresas têm um alto custo para o país e conseguir apoio para seu plano de privatização de muitas delas.
Esse relatório mostrou, por exemplo, que nas férias, os funcionários da Petrobras recebem adicional de 100% do salário em vez dos 33% que são pagos normalmente para os trabalhadores da iniciativa privada.
A prioridade do governo neste ano é vender a Eletrobras e os Correios. Essa última é presidida pelo general Floriano Peixoto, que tem salário de R$ 49.676, considerando participação no conselho de administração. Com isso, o general recebe mais do que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que ganham o teto do serviço público federal, de R$ 39,2 mil, e mais do que o presidente Jair Bolsonaro, cujo salário é de R$ 30,9 mil. Deputados federais e senadores embolsam R$ 33,7 mil.
Além dos salários mais altos do que os pagos na Esplanada, os militares que comandam algumas estatais ainda têm uma vantagem. Se a empresa for dependente do Tesouro (Embrapa, por exemplo), o conjunto da remuneração entra na regra do “abate teto”. Ou seja, tudo o que ultrapassar o salário do presidente da República é glosado. Agora, se a estatal não for dependente do Tesouro, a regra não se aplica.
É o caso da Petrobras. Isso significa que o general Luna e Silva poderá acumular o salário de presidente da empresa com a aposentadoria de general, um valor que os militares não divulgam, mas que estima-se na casa dos R$ 40 mil.
Apesar dos valores contrastarem com os pagos pelo governo, as remunerações das estatais não estão no mesmo nível dos de empresas privadas que têm ações em bolsa. Um levantamento do especialista em governança corporativa Renato Chaves, ex-diretor da Previ, revelado pelo Estadão no mês passado, mostrou que o salário médio dos principais executivos de mercado foi de R$ 940 mil em 2019.
Ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério de Planejamento, o economista Raul Velloso disse que a presença expressiva de militares no comando de estatais é mais uma barreira para a agenda de privatizações. “Os militares não receberam um treinamento a favor disso (das privatizações). São mais familiarizados com o sistema de estatais. Isso é histórico, vivemos até num período de regime militar que funcionou deste modo”, observou.
“Essa ideologia pró-privatização, acredito, que seja uma convicção do ministro da Economia (Paulo Guedes), não do presidente. Nunca ouvi Bolsonaro falar de privatização e das vantagens disso em comparação com as empresas públicas. Na prática, na hora em que Bolsonaro enche estatais de militares, ele não está querendo preparar uma empresa para a privatização”, complementou.
Elena Landau, economista e ex-diretora do BNDES, avaliou que o problema não é o comandante da estatal ser civil ou militar, mas se é qualificado para assumir o cargo. “O Luna e Silva, por exemplo, não é. Ele teve uma passagem de qualidade questionável pela Itaipu. A agenda de privatização não existe, então nem tem o que comprometer (essa agenda) com os militares no poder. O programa de privatização da Eletrobras e Correios é um mito. Guedes achou que ia transformar Bolsonaro, mas toda vida o presidente foi contra a privatização. Por que ia mudar agora?”, questionou.
Via PE Notícias